Uso
prático do EAV (Engª e Análise de Valores)
Realizei
na década de 80 um curso de EAV na Panasonic, que na época se chamava National,
o curso foi ministrado por japoneses vindos especialmente para isto, lembro que
com ênfase citaram que apesar do EAV ser uma metodologia americana foi no Japão
onde ocorreram os melhores resultados, num outro momento comento mais sobre esta
afirmação, agora o que quero mesmo é registrar que estes conhecimentos contribuíram
demais para o meu desenvolvimento profissional, e para obter o sucesso no caso
real que narro abaixo.
Em
1.990 fui contratado pela empresa Bicicletas Monark S.A. para realizar a sua desverticalização,
já que produziam praticamente tudo internamente, aliais este foi meu último
trabalho como empregado. Para não me alongar demais vou omitir alguns detalhes,
entretanto quero realçar que muitas tentativas em vão tinham sido realizadas,
pelo que ouvi foram anos de tentativas.
Antes
de tudo vale lembrar que o EAV pede um estudo de uma equipe multidisciplinar para
gerar novas ideias em cima de um objetivo previamente traçado, normalmente uma
racionalização que ao mesmo tempo melhore o produto ao usuário final (cliente)
e também que facilite a sua produção.
O
primeiro item que escolhi para externar foi a Abraçadeira do Guidão da Barra
Circular (na época era o modelo de bicicleta mais vendido no Brasil).
A 1ª coisa que fiz foi levantar todos os processos tomando o cuidado de fazê-lo sob todos os ângulos (visando atender todos os públicos), fui mais minucioso ainda porque trabalhava sozinho. Assim descobri que:
·
a demanda, se não me engano, era de 3.000 produtos por mês, e que os
clientes adoravam este modelo de bicicleta pela sua robustez;
·
a peça era estampada e utilizavam material relaminado para confeccioná-la;
·
seu processo de produção era composto por muitas operações (não me lembro
direito talvez fossem umas 12 operações);
·
todas as peças produzidas tinham muita rebarba no lado interno do repuxo,
fruto da falta de afiação na ferramenta da 1ª operação, e mesmo assim não eram
reprovadas;
·
a Monark não tinha a menor ideia de quanto era seu custo interno, como
aliais até hoje a esmagadora maioria das empresas brasileiras não o tem;
·
o preço objetivo era na verdade o valor da peça importada da China, desde
aquela época eles nos incomodavam, afinal eram e talvez ainda são o maior
produtor mundial de bicicletas. Portanto minha alternativa tinha que ganhar da
importação, ou ao menos chegar perto;
·
o ferramental no geral estava muito desgastado, alem das ferramentas
serem velhas elas não recebiam as devidas e necessárias manutenções;
·
não havia ficha de processo, e nem outro registro técnico, aliais o
próprio desenho do produto estava defasado;
·
verticalizada a Monark tinha naquela época o melhor desempenho financeiro
dentre todas as empresas de transportes no Brasil;
·
a Monark não era bem vista pelos fornecedores do seu nicho de mercado, isto
devido a sua estratégia de suprimentos;
·
finalmente verifiquei que por vários motivos ninguem efetivamente queria
aquela desverticalização, aliais me disseram que nem o próprio presidente da
empresa que era muito centralizador queria. Portanto para manter meu emprego
tinha que mostrar serviço e muito rapidamente.
A
2ª coisa que fiz foi analisar os dados objetivando as racionalizações sem
descaracterizar o produto:
ü
como na época o Brasil passava por mais uma crise, faltava trabalho para
as empresas, isso ajudou minha decisão de fugir dos “tradicionais fornecedores
daquele mercado”, ainda mais que o produto tinha uma alta demanda mensal;
ü
averiguei o porquê do uso do relaminado, pois sabia que se tratava de um
material especial, bem mais caro que o comum, e que seu uso é indicado para
operações onde se exige mais precisão;
ü
estudei tecnicamente e profundamente a possibilidade de reduzir as etapas
de produção.
A
3ª coisa foi formar o preço de compra e estabelecer as estratégias/regras para
negociar com os fornecedores, não imaginava que naquele momento estavam
nascendo as “Metodologias LC Consultorias de Custeio e de Precificação”, nos
cálculos incluí todos os aspectos técnicos, administrativos e econômicos, e os repassei/negociei
juntamente com as regras para cada um dos fornecedores pretendentes. Como o
preço calculado se mostrou competitivo frente ao preço objetivo (preço chinês)
e gerava um lucro líquido que seria atrativo aos fornecedores, seguro sequenciei
meu plano:
v
defini que iria consultar o maior número possível de fornecedores (de
todos os portes), para não haver nenhum tipo de dúvida e também para não deixar
espaço às futuras pretensões de troca de fornecimento, pois os escolhidos teriam
que arcar com os investimentos iniciais nos novos ferramentais e os
ressarcimentos viriam só ao longo dos fornecimentos (médio/longo prazo);
v
como as empresas não sabem calcular os preços como se deve apresentei
meus cálculos a cada um dos pretendentes, lembro que desenvolvi uns 15 no
mínimo, negociei cada etapa do cálculo com cada um para que todos tivessem o
pleno conhecimento do negócio, para que tivessem a certeza de que fora
elaborado para um fornecimento a longo prazo e que suas garantias estavam
alicerçadas apenas no trabalho, pois para uma futura troca de fornecedor seria
necessário ganhar de todo este processo;
v
estabeleci que seriam dois fornecedores, portanto a demanda seria de
1.500 peças/mês para cada um;
v
como não havia motivo técnico algum para manter o uso do relaminado, especifiquei
no calculo do preço o material comum, muito mais barato e com certeza sem perda
alguma das características do projeto inicial da peça;
v
apoiando-se em cálculos técnicos e na minha experiência em métodos e
processos formei o preço e estabeleci que todos orçassem a produção da peça em uma
operação (ferramenta progressiva), racionalizando assim o processo de 12 para 1
operação;
v
reservei a decisão da viabilização do negócio à presidência da Monark e que
esta decisão só ocorreria na apresentação dos meus trabalhos, assim
politicamente mantive a centralização dos desenvolvimentos bem como mantive todas
as regras assumidas com os fornecedores escolhidos.
O resultado foi que o negócio que apresentei ao presidente foi tão atrativo que não houve como recusá-lo, afinal sem nenhum investimento ganhariam duas novas ferramentas, muito mais produtivas e que produziriam com mais qualidade, reduziriam substancialmente os custos sem mais nenhum trabalho interno, e assim poderiam alavancar os investimentos nas atualizações do que estrategicamente continuariam produzindo internamente. Posteriormente da mesma forma externei outros aproximadamente 1.000 itens, e posso dizer que a esmagadora maioria dos fornecedores escolhidos se mantiveram fornecendo por vários anos, mesmo após minha saída da empresa.
Portanto fica evidenciado que o “emprego correto da
EAV”, mesmo que só por uma pessoa, proporciona grandes vantagens competitivas, e
neste caso prático se mostrou crucial para seu sucesso.